A propósito de um artigo da revista Visão (visao.sapo.pt/a-sala-de-aula-do-futuro=f798767?utm_content=2014-10-19&utm_campaign=newsletter&utm_source=newsletter&utm_medium=mail) sobre a sala de aula do futuro, escrevi há uns dias um post no Facebook que aqui partilho agora, melhorado.
Será esta a "sala de aula do futuro" que queremos e precisamos?
A cada dia que passa, refletindo sobre os enormes investimentos que foram feitos no país, no âmbito do Plano Tecnológico da Educação (PTE), face aos gigantescos problemas com que este ano letivo arrancou e ao autoritarismo burocrático das hierarquias, perante os problemas sociais dos nossos alunos e suas famílias com que somos quotidianamente confrontados ... a cada dia que passa, dizia eu, me incomodam mais as visões tecnocêntricas sobre o futuro da escola e sobre a sala de aula do futuro ...
Apesar de parte significativa do meu percurso profissional
ter sido realizada no domínio das tecnologias na educação (ou talvez por isso!!), não consigo
perceber como o futuro da escola (logo o futuro da sociedade, de todos
nós) pode ser completamente, ou melhor, sobretudo, mediado pelas
tecnologias ... ou seja, como as tecnologia passam a ser o fulcro, o centro da sala de
aula ... Onde fica a relação com a natureza: o tocar, o mexer, o cheirar as plantas,
os animais, a terra? ... Que lugar se dá às relações interpessoais, a relação com o outro, o
diferente no face-2-face? ... Deixa-se escapar o tocar, o abraçar, o dar a mão? ... Como
fazer a regulação dos conflitos, a organização e a construção
democrática e conjunta das regras, dos limites, dos valores, sem que se tenha
acesso a todos os sinais não verbais de comunicação tão importantes em qualquer encontro entre seres humanos? ... Como expressar adequada, criativa e espontaneamente, as
emoções e os sentimentos? ... Que lugar dar à educação artística, nas
suas diferentes manifestações? ... Fazer um bolo, uma salada, uma sopa, ou
mexer em tintas é completamente diferente de usar o "paint" ou manipular
imagens, são outras as emoções, outras as sensações provocadas, e tão importantes que são para o equilíbrio emocional de cada um ... Se os maiores
investimentos passam pela tecnologia (investimentos sempre muito
dispendiosos), os outros recursos culturais e educativos passam a ser
secundarizados, logo há dimensões do ser humano que passam também a ser
secundarizadas ... Há já quem muito se preocupe com o demasiado tempo
que muitas crianças passam a olhar para o écrã ou a manusear consolas.
Estou a fazer o papel de "advogado do diabo", mas o que estamos a viver
nos tempos que correm, cá e pelo mundo fora, das guerras às epidemias e
à forma como são tratadas, em minha opinião dever-nos-ia fazer ser mais
reflexivos, criteriosos e ambiciosos, em termos humanos, relativamente às salas de
"aula do futuro". Que visão temos do «ser humano»? Eu não quero (só) recursos tecnológicos na minha sala de aula - embora me desse imenso jeito ter mais dois ou três computadores. Prefiro ter por perto uma horta, um jardim, espaço
para correr, saltar e brincar ... Quero que a minha sala de aula seja um espaço humano, cultural e acolhedor, de curiosidade, aberto, em
relação com o que se passa à sua volta, no mundo natural, cultural e social - e para tudo isto, não preciso de muita tecnologia.
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